Informativo Digital de Trás-os-Montes e Alto Douro

Tudo bem à vista

Tome agora a hipótese de saberem os Estados Unidos que foi Israel a operar o ataque. Ainda assim, Biden nunca poderia reconhecer tal facto publicamente, porque para lá de logo desmentido, passaria a estar derrotado – já deve estar – nas eleições presidenciais que se avizinham.

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Prossegue, como há mais de sete décadas, a guerra no seio da faixa de Gaza, mas agora já a alastrar a lugares os mais diversos do Mundo, desde a Cisjordânia a Estados os mais diversos, aliados de Israel ou não. Uma guerra criada por Israel, fruto da ocupação dos territórios legalmente atribuídos à Palestina, mas também por via da violação dos Direitos Humanos por parte do Estado de Israel sobre os palestinos.

O caso mais recente desta guerra, ora a decorrer, foi o do ataque a certo hospital de Gaza. Num ápice, israelitas dizem ter sido a Jihad Islâmica, com o Hamas a apontar o dedo a Israel, e com a grande comunicação ocidental a ter de alinhar – como desde sempre – com a versão israelita. Como se dizia em certo anúncio antigo, tinha de ser. Naturalmente, perante uma tal assimetria de poder, a nossa grande comunicação social, oscilando entre o dever e a acefalia política, aponta logo o Hamas como o responsável pelo que se passou… Mas vamos, então, pensar um pouco.

Sabe-se agora que certo conselheiro de Netanyahu, ato contínuo, publicou um tweet, cumprimentado efusivamente o piloto que havia lançado a bomba que atingiu o tal hospital. Um hospital que já havia sido atacado anteriormente. Um lugar onde se encontravam estacionadas dezenas de milhares de palestinos, convencidos de que, sendo um hospital, não seria atacado.

O referido conselheiro, como facilmente se percebe, era um extremista israelita, que nem pensou duas vezes: de pronto se deitou a cumprimentar o autor do ataque. Perante tal idiotice primária – uma terrível falta de sangue-frio –, lá teve de pedir desculpa pelo que escrevera, salientando ter-se engado. E nós, claro está, acreditámos de imediato. Ou antes, o nosso Ministro dos Negócios Estrangeiros, quase com toda a certeza, dirá que acredita, salientando que Israel aponta a Jihad Islâmica como a autora do atentado, o que transforma logo a afirmação numa proposição verdadeira. Em síntese e como tantas vezes tenho escrito: temos a democracia.

Imagine agora o leitor que foi, de facto, Israel quem perpetrou o ataque. Acredita que Israel o reconheceria? Claro que não! Fosse intencional ou simples erro. E o que sempre nos viria Israel a dizer? Ah, que foi a Jihad Islâmica ou o Hamas. Portanto, se Israel o diz, é porque terá deser assim.

Tome agora a hipótese de saberem os Estados Unidos que foi Israel a operar o ataque. Ainda assim, Biden nunca poderia reconhecer tal facto publicamente, porque para lá de logo desmentido, passaria a estar derrotado – já deve estar – nas eleições presidenciais que se avizinham. Portanto, teria sempre de dizer-se ter sido a Jihad Islâmica, como se pôde ver pela voz de Joe Biden. Um facto que me traz ao pensamento certa afirmação de João Paulo II: a mentira nem mesmo ao serviço de um bem maior. Enfim, a distância que vai do absoluto ao relativo.

Para lá de toda esta conversa, convém salientar que existe uma divisão conhecida no seio do Governo de Israel, com Netanyahu e seus próximos a defenderem uma entrada em força por Gaza adentro, e alguns outros mais sensíveis às mil e uma pressões de todos os lados, amigos ou não. Ou seja: eles nem sabem bem o que fazer, ou já teriam atuado.

Neste conflito, o que quer que possa ocorrer de mau, ou de terrífico, será sempre da responsabilidade do Hamas, porque assim se comporta a grande comunicação social ocidental: de um lado Israel, do outro islamitas.

Mas olhemos agora a hipótese de ter sido o Hamas. O que ganhava este com tal ataque? Nada, e por esta razão simples, já antes exposta: tudo o que de mal possa ocorrer, é logo apontado pela generalidade da classe política ocidental, ou pela enorme maioria do jornalismo, acefalamente ou por cumplicidade, como tendo origem no Hamas. Mesmo o facto de os países islâmicos, ou outros, se distanciarem de Israel nada representa de realmente importante, ou as coisas há muito teriam mudado. De um modo simples: era a Israel que convinha este ataque, até porque aquele grande aglomerado de palestinos ao redor do hospital devia conter muitos elementos operacionais do Hamas. De resto, em face das garantias próprias de uma estrutura hospitalar, é muito natural que o Hamas por ali se pudesse movimentar. Simplesmente, Israel não pode assumir uma tal responsabilidade, dada a desumanidade que sempre comporta uma ação deste tipo. Um pouco como aquele avião desaparecido no Índico, de

que nunca mais se soube nada. Se foram os Estados Unidos a abatê-lo, como sempre me pareceu, até à luz de uma defesa legítima, ainda assim derrubar um avião de passageiros comporta uma reação de horror que ultrapassa, em muito, o valor de uma decisão lógica.

Por fim, Ana Gomes, nesta sua mais recente e inenarrável aparição de ontem à noite, na SIC Notícias. Deixo, pois, ao leitor, este meu conselho, que sei não levar a mal: reveja o programa, uma ou duas vezes, mas depois de visionar a intervenção de Ana, no mesmo canal, no passado domingo, e dê-se conta de como tudo mudou num ápice… Veja o modo como a jornalista pôs fim à intervenção de Ana Gomes e como, logo ali, garantiu que no próximo domingo só se irá tratar de temas nacionais. É como lhe digo, caro leitor: temos a democracia, e Ana Gomes é excelente, sim, mas para atacar o PS e António Costa.

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