Coro(n)ar o medo
(a propósito do medo ao novo coronavírus) Carlos d’Abreu (Duero Rayano), 14/16.III.2020
A quem serve o medo?
Está bom de ver que o medo é uma arma
Não uma arma de Liberdade,
não “un arma cargada de futuro”
mas uma arma ao serviço de totalitários desejos
É uma arma municiada por emoções
de que o quadro legal se pode socorrer
para impôr mais autoridade,
para testar o aparelho repressor
com pouco esforço,
deitando por vezes mão até
de um qualquer acelular e
submicroscópico ser,
que abundantemente
connosco partilha a Natureza
mas que num belo dia consegue saltar
para a garupa de um humano
que o oferece a outro, a outra, a outrxs…
O propósito é claro:
colonizar o bicho-dominante,
em geral, porque desconhece
que nesse grupo há uma multidão
subjugada a um punhado de celerados,
não distinguindo opressores de oprimidos
Mas alguns antropóides nossos coetâneos
divisam nesse ser (que não vêem)
um aliado, um sequaz que procura usar
para continuar a vencer,
a submeter, a lucrar
Primeiro ganha o capital
que reforça o poder de compra
de autoridade, vendendo banha-da-cobra
contra o medo, depois investe o lucro
no recrutamento de pretorianos guardas
que ajudarão a reforçar a obediência
(porque o poder lhe está a escapar)
Nesta parceria entre o anónimo-bicho
e o bicho-humano – que logo baptiza e
coro(n)a) – tem este por enquanto
levado a dianteira não obstante
alguns sérios reveses pandémicos
E porque todo-poderoso se sente
e imune se julga, tenta manipular
o vírus acusando-o ao microfone
dos mass me(r)dia de hostil
O apelo é o confinamento ao lar
para assim a incapacidade
do serviço de saúde escamotear,
por viver este das sobras
das democráticas corrupções
Mas depois do povo interiorizar
o medo pelo Estado expandido
ORDENO E MANDO!
é a primeira medida
Que saudades do estado de sítio!
Belo estágio para os democratas mais novos
– não sabe que é proibido andar na rua?
– agora autuo-o e para a próxima prendo-o!
Mas a clausura pode levar o povo a pensar
Pode levar a gente a reflectir
sobre a pobre vida que tem levado
e a perguntar: não haverá outra forma
de viver a não ser em permanente crise?
Para mal dos subjugados
ainda a Natureza capaz não foi
de desenvolver bicho letal
apenas dirigido ao grupo dominante
Esse seria o melhor serviço que Ela
(demasiado paciente, tolerante e
retardada nas suas decisões)
à Humanidade poderia prestar
Assim se faria a mais silenciosa e
justa revolução social de que há memória
Assim finalmente se alcançaria a Utopia
E seguramente novo caminho se abriria
rumo à capacidade de fotossíntese
em todos os organismos vivos,
para que desnecessário fosse
pelo pasto pelejar e num
falanstério o Mundo transformasse
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