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Competir é uma chatice…

Tenho boa memória, apesar dos meus já mui amplos 74 anos, e recordo bem a fortíssima oposição de uma ampla faixa da classe médica à generalidade das mudanças operadas no Serviço Nacional de Saúde, incluindo mesmo a criação desta estrutura.

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A esmagadora maioria dos portugueses conhece bem, até diretamente, os terríveis custos sociais e humanos de viver fora de Lisboa, Porto, Coimbra, Braga e talvez também Setúbal. Um desses custos é a quase completa impossibilidade de aceder aos cuidados de saúde, tão essenciais à tentativa de preservar a vida. Se a isto juntarmos as mil e uma restantes limitações, bom, temos um panorama que, de tão terrível, vem potenciando a desertificação da maior parte do País.

Tenho boa memória, apesar dos meus já mui amplos 74 anos, e recordo bem a fortíssima oposição de uma ampla faixa da classe médica à generalidade das mudanças operadas no Serviço Nacional de Saúde, incluindo mesmo a criação desta estrutura. Não terão passado quatro anos, e recordo uma entrevista de António Gentil Martins com Cristina Esteves, creio que no espaço do Instituto Português de Oncologia, em que este nosso médico voltou a mostrar a sua discordância em face daquele nosso serviço de saúde de referência internacional. E recordo, por igual, a polémica entre o então Ministro da Saúde, Carlos Macedo, e António Gentil Martins, que era, se não erro, o Bastonário da Ordem dos Médicos. Uma polémica que chegou a passar pela ameaça governativa de tirar o estatuto de utilidade pública àquela ordem profissional. Vivia-se, então, o tempo governativo da Aliança Democrática.

Por igual recordo que, de modo fortemente invariável, a classe médica sempre se opôs à criação de novas instituições públicas de saúde, mormente estruturas universitárias, de que as mais recentes terão sido a do Algarve e a da Universidade Católica Portuguesa, no seu polo de Lisboa. De modo que, de todas estas realidades, o que retiro é esta conclusão: está omnipresente, no seio da classe médica, um espírito fortemente corporativo, extremamente defensivo do seu estatuto cativo e enormemente contrário à competição que sempre terá de decorrer da abertura a novos médicos.

No meio de tudo isto, tenho que dizer que não li, nem escutei, a entrevista do ministro Manuel Heitor, embora dê de barato que a metodologia analógica de que parece ter deitado mão não terá sido a melhor, nem marcada por uma adequada análise do que está em jogo. A comparação com os casos dos cursos de engenharia nunca poderá colher, porque é vastíssimo o número de empresas que dispõem de engenheiros já com grande experiência, o que não se dá com o número de estruturas hospitalares. Todavia, existe no mau modelo adotado uma base que pode conter alguma razão.

Finalmente, criar duas novas faculdades de medicina na UTAD e na Universidade de Évora tem toda a lógica, até porque tal obrigará a criar, nas suas regiões de influência, os tais hospitais-mãe. E sobre Aveiro, a razão é inteiramente válida, dado o poder de expansão das respetivas funções para todo o interior que dela se expande, bem mais longe de Coimbra e do Porto. É um tema para o qual as estruturas da classe médica terão vantagem em conhecer a História da Universidade Técnica de Lisboa, mas também o que sempre se passou com o ISCTE-IUL. Foram partos para que nem cesarianas serviriam, mas que são hoje estruturas com projeção mundial. De um modo simples: com estes dirigentes médicos de (quase) sempre, ainda o Algarve estaria como estava, com a Universidade Católica Portuguesa a ver-se impedida de poder emprestar o seu prestígio e a sua qualidade académica a uma área que é vital.

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