Informativo Digital de Trás-os-Montes e Alto Douro

A coragem de falar verdade

A verdade é, todavia, a que se tem podido ver: vai-se tentando tudo para reposicionar o foco do problema, evitando assumir uma posição pública em face dos factos reiteradamente passados nos Estados Uni-dos, sempre tomados como um aliado, mesmo que venham, um dia, a organizar-se à luz de um Estado nazi.

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Um dia destes, tive a oportunidade de escutar um comentário de Luís Costa Ribas, correspondente da SIC há vários anos nos Estados Unidos, conversando a distância com Teresa Dimas, e tudo ao redor do funeral de George Floyd, bem como de quanto o antecedeu em matéria de História dos Estados Unidos, do racismo, da objetiva e nunca extirpada segregação racial (e da correspondente de posicionamento social dos negros), e da violência policial naquele país, coisas deveras conhecidas em todo o mundo.

A verdade é, todavia, a que se tem podido ver: vai-se tentando tudo para reposicionar o foco do problema, evitando assumir uma posição pública em face dos factos reiteradamente passados nos Estados Uni-dos, sempre tomados como um aliado, mesmo que venham, um dia, a organizar-se à luz de um Estado nazi. Basta ver o silêncio sepulcral com que a União Europeia, em particular Portugal, se tem vindo a colocar em face do que se está a passar na Hungria e na Polónia.

Ora, nesta sua intervenção recente, Luís Costa Ribas contou realidades desde sempre conhecidas, mas ra-ramente referidas pelo nosso jornalismo. Por um lado, que os Estados Unidos são um Estado da Comunidade Internacional que declara guerra a qualquer um com a maior facilidade. Por outro lado, que a violência é uma estrutura endémica aos Estados Unidos e desde a fundação do Estado. Também que o racismo nasceu com os próprios Estados Unidos. E depois, que a segregação racial, embora com subtilezas e estando proibido, continua presente e de modos diversos.

Para lá de tudo isto – é já imenso –, Luís ainda referiu aspetos diversos que condicionam a capacidade política dos legisladores, se, por um acaso, se determinarem a tentar mudar o horroroso estado das coisas nos Es-tados Unidos, desde os sindicatos da polícia, à organização de defesa da posse de armas, ao próprio Sistema de Justiça. Mas mais: a defesa dos acusados nem sequer pode ter acesso a aspetos diversos subja-centes à própria acusação, nomeadamente, o caso do passado de queixas contra este ou aquele po-lícia. De um modo sintético, digo eu agora: a polícia é, nos Estados Unidos, um verdadeiro Estado dentro do Estado. Como um dia disse a um ainda hoje grande amigo, que foi dirigente do MRPP, a velha Direção-Geral de Segurança, (DGS), ao pé das diversas polícias do Estados Unidos – CIA, FBI, Imigração, polícias dos condados, etc. –, era uma autêntica organização de brincadeira. E o meu amigo, sempre condenando a DGS, lá reconheceu que, neste domínio, eu tinha razão.

Se o leitor tiver estado atento a todo este caso que levou ao homicídio de George Floyd, terá percebido que a enormíssima maioria dos nossos políticos nunca se pronunciou contra a ação violenta das polícias nos Estados Unidos – recorde o que por cá se passou com os Skripal e com Kashoggi…–, contra a continuação prática do racismo naquele país, nem os jornalistas se determinam a tratar, capaz e amplamente, o caso do racismo naquele país e desde a sua independência. De molde que deixo esta pergunta: será esta realidade muito diferente do que se tinha na nossa II República, mormente depois do início da defesa das antigas províncias ultramarinas? Pois, a minha opinião é que essa diferença é ínfima.

O que Luís Costa Ribas mostrou foi que teve a coragem de responder às questões que Tereza Dimas lhe colocou, mas dizendo o que, conhecendo-se por cá à saciedade, rarissimamente se fala.

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